quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Kid Foguete no matadouro: Mais da mesma estética norte-americana.

As recentes imagens expostas na grande mídia, mostrando a tortura e os maus-tratos a animais em frigoríficos e matadouros estadunidenses, geraram perplexidade. Na época do politicamente correto e do avanço da “democracia americana”, a grande mídia sabe mostrar onde desemboca o que Bush chegou a denominar de “mundo civilizado”. Para tal, o conto de Charles Bucowisky, “Kid foguete no matadouro”, é tão ácido e causticante como também uma bela denúncia da “Indústria da carne”, acusada substancialmente de viciar seus consumidores e impulsionar uma epidemia de obesidade nos EUA.
Na verdade, as imagens contidas em vídeos distribuídos por associações de defesa animal, não trazem nada de novo. Uma série de documentários, reportagens e depoimentos dignos de filmes de terror, já salientaram o sacrifício a que os animais tem sido submetidos em nome da indústria da alimentação. Além disso, o consumo de carne é um dos vilões da epidemia de obesidade que atormenta os EUA e outras nações do chamado “Primeiro mundo”. Acredita-se que 30% dos americanos já estejam sofrendo de algum grau de obesidade, o que tem onerado o sistema de saúde do país e feito com que o Governo tenha implementado políticas de redução de calóricos já nas escolas. Os movimentos de defesa da vida animal já se mobilizaram, a ponto de redes de supermercado já terem anunciado o recolhimento de 70 mil toneladas de carne animal (o que parece um gesto mais representativo do que realmente funcional).
A implementação de novas políticas alimentares, entretanto, enfrenta a resistência de grandes conglomerados econômicos. Algumas das maiores empresas americanas estão no ramo da alimentação (se é que podemos chamar os burguers de alimentação). Estas empresas, com faturamento na ordem dos bilhões de dólares só perdem para as empresas de capital baseado na indústria petrolífera ou armamentista. A febre do “Fast food” norte-americano se alastrou especialmente nos anos da política neo-liberal, o que permitiu a “globalização de costumes” e a importação do modelo de alimentação das grandes cadeias americanas (leia-se Bob´s, Burguer King e especialmente Mc Donald´s). Acredita-se que a obesidade esteja se tornando uma epidemia até mesmo em países com uma mesa regulada, onde os vegetais são bem-vindos, como o Brasil. Não por coincidência, o consumo de carne vermelha dobrou na década de 90 na mesa dos brasileiros, e outros tipos de carne passaram a ser base da alimentação, como o frango. Prudente lembrar que a carne de frango é carregada de hormônios de crescimento e alguns países europeus colocaram, em relação a isso, reticências na compra do produto durante algum tempo. Em detrimento a isso, o consumo de feijão e arroz caiu vertiginosamente, dando lugar a lanches, massas e gorduras trans e saturadas.
Nas décadas de 80 e 90, ambientalistas e biólogos apontaram para um fenômeno assustador: As florestas tropicais, em demasia na América Central estavam sendo dizimadas por empresas no ramo de alimentação. A causa principal seria a derrubada de mata verde para a produção de pastos. As indústrias tentaram justificar o fenômeno com o aumento do consumo de carne, e o respectivo crescimento dos rebanhos para atender a demanda do mercado. Para exemplificar a situação e o desregule de tal mercado, o Brasil tem 180 milhões de habitantes e mais de 200 milhões de cabeças de gado. Um bovino de médio porte consome até sete vezes mais água que um humano adulto. No que é gasto na produção de um quilo de carne bovina, poderiam ser gerados até 15 kg de vegetais. Além de saciar a fome de países inteiros, geraria uma massa de empregos diretos e indiretos e distribuiria emprego e renda. O sistema de saúde não teria de enfrentar o número de 500.000 casos de doenças coronárias, maior parte deles, causados pela associação perigosa de sedentarismo, tabagismo e consumo de altas taxas de colesterol. O “negócio da carne” é tão lucrativo e tem crescido tanto no Brasil, que em junho de 2007, o Friboi, de Goiás, anunciou a compra da Swift, 3ª maior cadeia de frigoríficos dos EUA. Evidentemente, tocar na “cultura da carne” é mexer em milhões de dólares.
Quando se fala em cultura, é prudente observar que essa situação não pode ser modificada em dias e sim, em anos. Uma das melhores propostas para o assunto é a lavoura da subsistência e a agricultura familiar. O consumo de carne nestes espaços tende a ser limitado, mas apontaria um decréscimo importante, modificando a economia dos pequenos municípios. Em seguida, campanhas de racionalização do consumo. Ou seja, diminui-lo, mas não encerrá-lo. O programa de merenda escolar deveria estar inserido nesta proposta. Estudos apontam que inicialmente, a queda no consumo aumentaria provisoriamente o número de rebanhos, para compensar a queda no preço, mas em menos de uma década, esse número deveria estar estabilizado e em decréscimo, dado a pouca receptividade no mercado. Como paliativo, as organizações ambientalistas dos EUA e da Europa tem exigido medidas radicais de seus governos, como a criação de políticas para que as grandes empresas da alimentação adotem regras-padrão para o “abate mais humano e menos cruel” dos animais. Podemos sugerir mais: Que as empresas do ramo, e especial do Brasil, sejam proibidas de usar a figura de animais felizes e sorridentes em suas propagandas, já que isso é uma política de atenuação e aproximação com o público infantil, grande alvo de suas campanhas publicitárias. Outra: Que provando a higiene e total segurança do produto oferecido, como salientam as donas do mercado, sejam veiculados vídeos contendo os abates dos animais. Temos certeza de que uma sessão destes vídeos faria o consumo despencar no dia seguinte. É bom frisar: Uma sessão apenas!
A discussão é bastante delicada: O mercado da pecuária movimenta bilhões de dólares somente no Brasil. Além disso, podemos considerar a forte influência política e cultural na formação da economia brasileira e a geração de empregos. Por isso, um estudo minucioso aponta para efeitos de racionalização de consumo e paliativos na construção de outras formas de emprego e renda. A diversificação das culturas agrárias é um exemplo: Alterar bruscamente um cultura alimentar pode introduzir a monocultura como saída emergencial de vários produtores. Portanto, essa uma discussão bastante delicada. O que tem de ser pesado não é só o politicamente correto, mas que tipo de projeto de Esquerda estamos tentando criar. No projeto que desejamos, a vida é objetivo principal, seja de homens ou animais. A dignidade da mesma, é, portanto, alvo de nossa discussão. Não estamos propondo acabar com a pesca numa cidade litorânea como Rio Grande, mas sim racionalizar o consumo e diversificar a economia, gerando renda de forma sustentável e segura para o próprio meio. A única certeza que temos é que manter a produção e o consumo de carne nos níveis atingidos atualmente, é alicerce de uma indústria extremamente lucrativa e socialmente irresponsável e que por sua vez, apresenta perigo não só a vida animal, mas a própria raça humana. Temos de pensar o mundo de forma universal e completa, numa ética ambiental que nos permita acabar com a fome, alimentando com qualidade e gerando milhares de empregos. E isso, a “Indústria da carne”, com certeza, não pode fazer.
Fabiano, 19 de fevereiro de 2008.

2 comentários:

Rosali Alves - Desenhista disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Oi Fabiano. Muito legal! A maior revolução que uma pessoa pode fazer começa PELO SEU PRATO. Precisamos de um mundo vegetariano, por uma questão ÉTICA. A ética de respeitar os outros seres sencientes, pois o bicho homem não deve ter o direito de torturar e matar bilhões e bilhões de outros animais diariamente. Discordo de ti na questão de que seria justificável um consumo menor de carne ou na de que não se propõe o fim da pesca numa cidade como Rio Grande. Não existe meia escravidão, ou ela existe ou não existe. Nada justifica o homem utilizar outras expécies para qualquer fim. Assim como também nada justifica escravizar os da sua mesma espécie. O homem não é superior às outras espécies animais. Já disse o grande Charles Darwin, todas as espécies derivam de um único ser, as diferenças entre a espécie humana e as outras espécies animais é somente de grau.
Citando o Dr. Laerte Levai, membro do Ministério Público de SP, que recentemente esteve em Rio Grande: ...Porque se mostra tão difícil coibir a ação de pessoas que agridem, exploram e matam os animais? Respostas a essas indagações estão relacionadas à estrutura sócio-cultural em que vivemos, ou seja, ao sistema perverso que dita as regras do nosso comporatmento, da nossa metodologia científica, da nossa alimentação, do nosso vetuário, das nossas diversões e, porque não dizer, da nossa própria maneira de pensar. Conscientemente ou não, nós decretamos a miséria dos animais. As escolhas que fazemos têm sempre um viés de dominação, como se as outras espécies - tidas, preconceituosamente, como criaturas inferiores -, estivessem no mundo apenas para nos servir.

Olha, não haverá socialismo enquanto os humanos não aprenderem a respeitar as outras espécies.
Abço
Márcia Chaplin