terça-feira, 7 de abril de 2009

Foram apenas 15 anos.



É difícil medir o impacto que Kurt Cobain teve sobre a música pop. Na verdade, sobre todo o comportamento dos adolescentes num período muito breve, mas por outro lado, bastante intenso, que foram os (loucos) anos 90. Cobain foi, em tese, um produto lançado pela mídia, que saiu de linha com defeito, mas consumido em longa escala por todo o escalão underground. Para aqueles, que como eu, acompanharam o Nirvana desde o estouro de “Smells like teen spirit” nas FMs (novembro de 1991) e saíram encomendando o LP “Nevermind”, foi fácil enxergar que alguma coisa estava acontecendo. O mundo pop e tudo aquilo que estávamos escutando até então, não seriam mais os mesmos. As bandas que já curtíamos como Jane´s Addiction, TSOL e outras, passariam a ser consumidas pelo mercadão.
Kurt Cobain não abriu o mercado para o underground. Na verdade, este trabalho não foi sequer feito por uma banda de Seattle, mas por uma californiana, chamada sugestivamente de “Jane´s Addiction” (Vício de Jane), com o álbum “Nothing´s shocking” (1989). O Nirvana pôde sim, e com muita competência, escancarar essa brecha. Se antes, nós conhecíamos “Change Today” do TSOL, o Nirvana lembrou a milhões de pessoas, que dentre o underground, existiam essas pérolas. A frente da mídia, Cobain personificou um intenso Sid Vicious, que se engorda para se auto-consumir, mas sem o humor sórdido de um Johnny Rotten. Na verdade, Kurt Cobain não dispunha de nenhum humor. Não é por acaso, que seu segundo disco, um marco na história do rock contemporâneo, tem a mórbida semelhança no título (“Nevermind”), com o único disco dos Sex Pistols: Os dois eram fenômenos intensos, lucrativos, porém, como sua própria essência indica, efêmeros. Kurt fez o seu papel. O que se discute é: Precisava ser tão rápido?
No dia da morte de Kurt Cobain (8/4/1994), eu fui até a casa do Rafael. Lembro que ficamos sentados esperando escutar algo mais confiante, já que uma série de boatos surgia. Estava com uma camiseta branca amarrotada, surrada e um jeans velho, rasgado no joelho naturalmente, por uso, e não por moda. Além do cabelo comprido e dos brincos, estavam na minha cabeça, uma série de indagações, nas quais, lembro agora, o valor da ascendente URV (Unidade Real de valor) e a de quanto tempo os anos 90 ainda restariam. Pouco depois foi confirmada a morte do “vocalista do Nirvana” e ficamos em silêncio, estupefatos, de como alguém alcançou tudo e colocou esse tudo fora. Falávamos sobre isso. Era tarde de sol fraco e vento. Uma desgraça anunciando o outono.
Passados três anos da morte de Kurt Cobain, escrevi um ensaio sobre esse fato num fanzine. Não vou repetir o que já disse à época, ainda que sinta as mesmas coisas. De qualquer forma, hoje, mais maduro, enxergo que algumas pessoas não sabem lidar com as pressões e nem sequer contenham aquilo a que chamam de “atitude”. Kurt, na verdade, a contragosto, foi empurrado por boa parte do caminho. Nós, que comprávamos os discos, as revistas, e vimos o show do Hollywood Rock 1993 (no meu caso, pela TV), já sabíamos que aquilo era grande demais, mesmo para nossa época, mas também, tão rápido quanto. Cobain personificou um espírito de mudança que rondava o mundo e a nós mesmos no inicio dos anos 90: Democracia, liberdades individuais, fim aos namoros normais, e uma série de alterações no comportamento jovem aconteceram nesse período. Para nós, nesse lado da borda do mundo, tudo que importou por um período, foi a queda de Collor (1992) e o sonho de Lula (1994), os fanzines falando de Anarquia e um monte de discos bacanas, que graças a abertura do mercado, nos chegavam. Estávamos tão encantados com tantas coisas, com as camisetas pretas, com as gurias com discursos feministas, com as festas nas casas dos amigos rolando LPs, que por muito, não compreendemos que Kurt Cobain era parte desse espírito, que aliena, mas que por outro lado, se não prolonga, pelo menos dá mais sentido à vida.
Hoje, é bastante viável, que as hostes mais conservadoras usem Cobain como um exemplo do que não se deve fazer. Para nós, o vocalista do Nirvana, encarnou por alguns minutos (e lembro bem, da tarde fria de 1992, na vitrine da JH Santos, vendo “Territorial Pissings” no Programa Livre) tudo aquilo que estávamos e sempre estamos a fim de fazer, seja aos 16, seja aos 32. O motivo de tudo isso, é bastante simples: o conservadorismo, a chatice e a moral ainda são as mesmas. As novelas assistidas pelo Clube de mães ainda são as mesmas ou têm as mesmas tramas. As matérias do Jornal Nacional ainda são as mesmas, e os inimigos da boa sociedade brasileira ainda são os mesmos. Para que mudar, se os inimigos fazem questão de serem os mesmos? Não precisamos nesse caso de criatividade, mas sim, de longevidade. Se tivéssemos isso, Kurt Cobain ainda estaria aqui, lamentando o fim da sua juventude, mas curtindo o pouquinho que ela ainda poderia lhe render.

Fabiano da Costa, 7 de abril de 2009.